[Resenhas] À Beira do Caminho

Num ano fraco em produções brasileiras (estamos, no momento da elaboração deste texto, no meio de agosto de 2012), “À Beira do Caminho” surge como um dos poucos bons filmes nacionais de 2012. Franco, honesto, sem grandes firulas: tinha tudo para cair no piegas, e não cai. Breno Silveira, cercado de uma equipe técnica competente, se apoia em um enxuto roteiro de Patrícia Andrade em cima de argumento de Léa Penteado (que trabalhou com Roberto Carlos por bastante tempo), faz um filme simples mas emocionante “em cima de músicas de Roberto”…

O motivo das aspas ? Reza a lenda que, das 12 canções inicialmente pensadas pela equipe para conduzir o filme, Roberto Carlos teria liberado somente quatro. A roteirista Patrícia (que já estivera com Breno no excelente “Dois Filhos de Francisco”) não se intimidou e usou as quatro gravações originais do Rei para pontuar momentos-chave do protagonista. Para minha alegria, três das quatro são algumas de minhas favoritas na obra de Roberto: “A Distância” traz o personagem principal, João, em seu momento “não sei o que fazer de minha vida longe de você” (“e na distância morro todo dia / sem você saber”, e eu choro…). “Amigo” (que apesar da bela mensagem sempre achei chata) marca a amizade entre o caminhoneiro e o menino Duda. A clássica “Outra Vez” (de Isolda) marca um dos momentos de reencontro de João com sua própria história. Já “O Portão” acaba sendo fundamental em dois momentos: o da tentativa (e erro) em corrigir o passado e o do desfecho, onde somente então a canção toca até o final.

Mas, para deleite do espectador fã de Roberto, Breno e Patrícia foram além, driblando a resistência e as proibições do Rei escolhendo composições que Roberto imortalizou mas não são composições suas. Outra música “clássica” aparece em dois belos momentos: “Nossa Canção” (de Luiz Ayrão, e que adoro) aparece com João cantando ele mesmo numa festa (a preparação vocal do filme é de Deco Fiori) e também na gravação recente de Vanessa da Mata. “Esqueça” (Mark Anthony/Roberto Côrte Real) pode ser ouvida na voz de Nina Becker. Os mais novos não reconhecerão Marcio Greyck em “Impossível Acreditar Que Perdi Você”, e tem até um Chamego Tropical (quem?) relembrando “Só Vou Gostar de Quem Gosta de Mim” (de Rossini Pinto). Não posso deixar de citar outra de minhas favoritas: “Como Vai Você”, na singular interpretação (e com a letra original) do saudoso Antônio Marcos.

Mas não pense que é um filme musical. Na verdade, a trilha robertocarliana aparece apenas em momentos cruciais, e vale a pena citar também, na mesma linha, as frases com as quais o protagonista cruza em suas viagens, como “Viver é como desenhar sem borracha”, “Para quem não tem nada, metade é o dobro”, “Espere o melhor, prepare-se para o pior, e aceite o que vier”, “Não há mal que perdure, nem dor que não se cure” e outros chavões típicos das traseiras de caminhão.

O elenco é ótimo, em interpretações tão simples quanto o filme. João Miguel é um ator soberbo: mostrou seu enorme talento no maravilhoso “Estômago” e foi desperdiçado em “A Suprema Felicidade“. O filme é literalmente dele, simplesmente brilhante. Dira Paes é coadjuvante mas é outra que faz qualquer papel. Vinícius Nascimento foi um grande achado, uma excelente escolha para o papel de Duda. Vencedor de seis prêmios no Festival de Cinema de Pernambuco, é um ótimo filme, com destaque para a fotografia de Lula Carvalho. Na impossibilidade de escolher o excelente “Febre do Rato” como pré-indicado ao Oscar, forte demais para os velhinhos da Academia, eu mandaria este “À Beira do Caminho”, considerando as poucas opções realmente boas de 2012. Não deixe de ver: é uma pena que o filme não consiga um décimo do público das comédias e blockbusters em cartaz…

Tommy Beresford

~ por Tommy Beresford em agosto, 14 2012.

Uma resposta to “[Resenhas] À Beira do Caminho”

  1. Para ver e se emocionar.

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