[Resenhas] Uma Noite em 67

Mesmo para quem já viu várias cenas no Youtube, “Uma Noite em 67” — que relembra o III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, realizado em de 21 de outubro de 1967, no Teatro Paramount, São Paulo — passa a fazer parte da ainda discreta lista dos filmes imprescindíveis de serem assistidos em 2010. Além de trazer de volta a tão necessária reflexão musical (e comportamental, e política) do Brasil do final dos anos 60, os diretores Renato Terra e Ricardo Calil, no primeiro longa de suas carreiras, criaram um filme extremamente simples, mas totalmente capaz de emocionar. Para quem gosta de música brasileira, é impossível não se arrepiar e muitas vezes chorar com algumas cenas.

Mas é um filme também muito bem humorado, seja nas imagens da época (com Cidinha Campos e Blota Jr fazendo entrevistas impagáveis), seja nos depoimentos recentes de grandes astros da música como Chico Buarque, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Gilberto Gil, Edu Lobo e Sergio Ricardo (que acabou ficando mais famoso por quebrar e arremessar um violão contra a plateia na noite final do festival do que propriamente por seu grande talento), além de outros nomes ligados à música, como Zuza Homem de Mello, Sergio Cabral, Solano Ribeiro e em especial Nelson Motta.

Uma bela e necessária viagem no tempo. Vale a pena relembrar Edu Lobo e Marilia Medalha cantando “Ponteio” logo no início, com depoimentos atuais do próprio Edu. As cenas da época são em preto e branco, em baixa qualidade de imagem e som (mas com o melhor da tecnologia da época) se contrapõem a uma excelente fotografia (de Jacques Cheuiche) com enorme nitidez (assisti na sala 5 do Unibando Arteplex, uma das melhores do Rio). Vale a pena lembrar também do contexto político da época, das opiniões musicais (dois meses antes, houve uma “passeata contra as guitarras”), da qualidade enorme de criação pela qual a música brasileira passava: as 12 concorrentes da grande final eram compostas e/ou defendidas por nomes que sem dúvida fazem e sempre farão parte da história da MPB e de nossa memória musical e afetiva.

Os trechos dos músicos se apresentando ou apenas circulando nos bastidores do festival são deliciosos — enquanto um Gilberto Gil de barba que quase não foi à final dá entrevista, Nara Leão se intromete na cena, Nana Caymmi magérrima passa por trás, Roberto Carlos conversa com alguém pelo caminho… Os Mutantes são ainda tratados como “estes meninos” e Chico Buarque dá show de não-entrevista…

Nos depoimentos atuais, Roberto Carlos confessa que também gostava de cantar canções de Chet Baker, que não escolheu a música “Maria, Carnaval e Cinzas” para defender no festival, mas “foi escolhido”: a canção de Luiz Carlos Paraná ficou em 5º lugar.

Já Caetano Veloso (que também fala sobre o Tropicalismo posterior) não consegue tocar direito nem ao menos lembrar da letra de uma de suas músicas mais conhecidas pelo grande público, “Alegria, Alegria”, 4º lugar na grande final, interpretada por ele e os Beat Boys com guitarras, tão criticadas na época.

Com seus olhos claros em close e sem lembrar de algumas passagens da época (“Caetano lembra, mas eu…”, revela ele), Chico Buarque também se enrola ao relembrar “Roda Viva”, mas as cenas de Chico com o MP4 interpretando novamente a canção ao ser anunciado o 3º lugar são inesquecíveis e emocionantes.

Rever Gilberto Gil e Mutantes com “Domingo no Parque” (2º lugar) também emociona: como um dos depoimentos bem colocou, é sem dúvida uma das grandes canções brasileiras de todos os tempos, embora Gil nem a ache tão bela assim.

Edu Lobo, Marília Medalha e o grupo Quarteto Novo enfim entoam seu “Ponteio” (de Edu e Capinam) como a grande vencedora, com todos no palco (abaixo, foto de Wilson Santos, do Jornal do Brasil, um dos grandes jornais da época e que sintomatica e infelizmente deixou de existir em sua edição impressa no dia em que assisti a “Uma Noite em 67”).

Ao final do filme, ainda podemos ouvir a Melhor Intérprete, Elis Regina (que, como Nara, aparece apenas circulando nos bastidores), entoando “O Cantador”, de Dori Caymmi e Nelson Motta.

Imperdível. Simples, direto, objetivo, emocionante: um dos melhores filmes de 2010. Mais um documentário nacional que poderia ser tranquilamente exibido nas escolas. Quem não conhece nada da história precisa conhecer. Quem já viu tantas vezes vai se emocionar ao rever.

Tommy Beresford

[Update – Este é um texto muito especial para mim pois, tal como Toy Story 3, foi parar num livro didático! Mais informações em breve!]

~ por Tommy Beresford em setembro, 01 2010.

3 Respostas to “[Resenhas] Uma Noite em 67”

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